Sobre ônibus e pontuações

Observo o céu pela janela embaçada, entre os rabiscos que fiz vejo infinitos tons escuros manchados por raios claros e profundos, a chuva cai devagar e os fones no ouvido trocam os trovões por um melodia envolvente e misteriosa,  trilha sonora perfeita para um possível programa mal intencionado, mas não é o caso.
Ao meu lado, a melhor companhia que eu podia ter; minha aflorada e desinibida imaginação, ora ocupada com as sombras no teto, ora escrevendo cartas para quem não sabe ler, nem tão focada, muito menos vigilante.
Fabrico motivos a me atordoar e tento me livrar deles com poucas lembranças que guardo entre tantas fantasias.
Fecho os olhos e sorrio quando minha pele arrepia, assim que os abro, já não lembro a razão.
Me desfaço para tentar entender e tento não mais pensar nisso.
Viajar nunca é só percorrer caminhos, essas poltronas desconfortáveis são ótimos divãs.
Estrada é terapia.
Viajar é ajeitar as palavras, rasurar, experimentar sinônimos e descartar antônimos.
Levo a mala cheia de interrogações e desembarco cheia de reticências, mudo de lugar algumas vírgulas e entre isso e aquilo acomodo minhas certezas.
O que já era indefinido volta em outro idioma, o desejo só aumenta, a razão idem.