Utópica

Tenho a ligeira impressão de que vivo presa à contradição.
Adentro a noite sem fechar os olhos, nego a razão e devaneio em vão.
Muralhas de desejo e medo se erguem lado a lado, e eu almejo que caiam.
Iam então, sem pressa alguma, encarar a realidade insólita, os fatos e os contos.
Rasgo os mapas e de seus pedaços faço confete, acredito no improvável e não me rendo ao óbvio escancarado.
Idealizo, com fascínio, o toque e o gosto, e incontáveis vezes me contento em silêncio.

Sob o céu enegrecido, ao contemplar o brilho da lua, sustento no face, a alegria do peito.

Anti-herói

Pairam sobre meus olhos lembranças incertas, embaçadas feito sujeira na janela que por muito tempo estiveram escondidas sob densas cortinas de determinação.
Engoli seco o que me veio a boca, não foi amargura, era a mais doce tristeza.
Senti a traqueia se comprimindo e os pulmões pareceram se encolher no peito.
Por um momento, também senti o coração parar de bater.
Meus dedos se atraíram feito ímãs invertidos e não consegui disfarçar a inquietação, quase pude prever minha tez desfalecendo, os ombros se rebaixando, o caimento dos olhos e uma curva se formando em meus lábios. Mas ali, naquele momento, tive certeza de que o monstro é real. E apesar do pavor que me causa, eu quero enfrentá-lo.
Mas não posso, não sei lutar, não tenho armas e muito menos superpoderes.

É preciso fugir.  

Sedentarismo?

Escrever é um exercício de força.
É preciso pegar pesado com palavras de todos os pesos e calões e transpirar emoções pelos poros inócuos da banalidade das linhas paralelas que se preenchem com o mesmo entusiasmo de uma criança que olha para fora da janela do ônibus sem se preocupar com as curvas do caminho, enquanto a bioquímica, reage em cada célula lipossubstituída pelo tédio a transformando em um pequeno condutor de serotonina.
É preciso atrofiar as ideias vulgares e anabolizar os pensamentos excêntricos.
Escrever é se livrar daquilo que se tenta esconder sobre vestido curtos, canções doces e relacionamentos rasos.
Escrever é ter objetivos tão efêmeros quando fugazes a reluzirem aos olhos de quem lê.
Escrever é tomar um banho frio nas águas da imaginação.
É sentir câimbras nas mãos agitadas e carregar com orgulho toda a academia nas costas; lápis de esforço, esteira de borracha, anilhas esferográficas, sem jamais se esquecer da dose de way de inspiração.

Escrever é para os fortes de espírito.
Para os fracos de artigo.
E também para aqueles que apenas almejam entre verbos e preposições um adjetivo quase inalcançável proposto por uma oração de quem sabe falar mas não ousa fazer.

Antox C

Divago pela contra mão de teorias reflutantes de todos os lados.
Há tantas perguntas sem respostas e tantos contos almejando serem fatos.
As estrelas no céu não se apagam pelos pecados cometidos na Terra.
Eu fecho os olhos e me vejo correndo sem destino, os abro e me perco na escuridão da sociedade.
Ainda cultivo desejos cheios de esperanças e planos de um cotidiano não limitado por cargos e cargas.
Confronto minhas próprias ideias até encontrar algum sentido, mesmo incompreendido, a despistar a loucura eminente de deixar de existir para construir a história da minha vida.
Na altura do campeonato, no ringue da insensatez, corpo, coração e cérebro disputam o prêmio de piores decisões.
Fuga é frustração, saudade é ingratidão. Ambas são faces de uma moeda da sorte posta a mercê do azar.
O futuro é longe demais para prever o caminho e o presente curto demais para preparar a chegada.
O que há demais em parafrasear grandes imbecis para chegar a conclusões tão idiotas quanto às originais?
Eu acordei no mundo errado.
Talvez eu deva ter me perdido a caminho do asteroide  B612, e desconfio que o grande Pequeno Príncipe está  a minha espera para que possamos ver quantos pores do Sol foram precisos para entendermos que na nossa insignificância significamos muito um ao outro, e também às rosas e as aposas que nos vêm com os corações.
Lá fora vejo países em guerra, vejo tramas tão complexas que minha ignorância não consegue compreender e ao meu redor, só marionetes frias e covardes.
Onde está a razão?
Abstenho me de álcool e comprimidos para nao expor o juízo em risco.
Vez ou outra me permito desliga-lo por alguns momentos antes de cair em sono profundo, implorando por sonhos lúcidos, que já não mais domino com facilidade.
Rogo aos céus sinais improváveis que não me impedirão de tomar atitudes estúpidas no futuro.
As circunstâncias gritam não. O instinto sussura, quase inaudível, para ir em frente.
Medo e desejo transitam no campo minado da improbabilidade.
Na mais das vezes,  espero  que tudo vá pelos ares sem que se possa identificar os destroços de toda incoerência.
Se apenas bombeia sangue, o coração não é um órgão vital, não passa de um gerador de imbecialidade infinita, facilmente substituíveis por artefatos mecânicos.
É  preciso disparar, bater apertado, sair pela goela e com sorte, quase parar, por paixão, por um ideal que valha a pena seguir em frente.
O que torna as pessoas medíocres são as oportunidades que elas jogam pela janela enquanto abrem as portas para as ideologias baratas vendidas como milagres.
Esqueça os meios e o "caminho do padre", varra os cantos, limpe as vidraças e refresque-se na sua própria santidade.

Garota de Papel

Sob a pele escondo histórias que não tem meio nem fim.
Os olhos, caleidoscópicos, se iludem no espelho.
Nas veias circulam boatos do que fui.
Inalo boas lembranças, exalo planos absurdos.
Na mente, lista, números e mais listas de tantos pormenores.
A realidade servida às traças, cede a honra para a fantasia.

Com toda a positividade que há em mim

O perfume que se espalha com o vento é inebriante.
No meu peito, canta, e nas curvas, dança.
Me faz, aflita, querer ser artista, 
Eternizar, com meras palavras, meu amor infinito.
Felicidade não é o destino, nem o caminho.
Felicidade é o que sinto quando você me tira do sério e me leva paz.

Entre insistir e desistir


As horas tinham se arrastado até aquele momento,  mas então,  não precisava mais de relógios, não havia mais tempo.
Sustentava um sorriso sincero apesar das pernas bambas.
Canções baratas preenchiam o  curto silêncio entre um assunto e outro.                              
Confissões,  conselhos. Ou quase isso.                                      
Cinco taças depois, os olhos se rendiam às lágrimas repetidas,  já tinha mexido em todas as feridas e a verdade doía feito faca na carne.
A rejeição é insuportável.

Passado e futuro lutam bravamente , mas o presente está cansado de assistir.
Não quer jogar a toalha, precisa entrar no ringue (para bater ou perder).

Labaredas congeladas

O mede insiste em se manter imaculadamente próximo, mesmo com a reverberante verdade de que o perigo nunca esteve presente.

Fagulhas de arrependimento pairam sobre o ego.
Faíscas contidas aos poucos transformadas em brasas.
Álgido como há de ser a neve, escolhes então a morte como quem se cobre com seda ao desprezar as vestes rasgadas.

Sê então mórbido para com aquele que não teve nenhum entusiasmo.
A claridade incomoda os dias que parecem despertar de noites ébrias, Com ingratidão os olhos se fecham no mesmo rosto que outrora conteve risos histéricos.
Sigo como quem tenta fugir de si mesmo, em vão.

Parece Asma

Resmungam os pulmões enquanto se inflam para receber o ar que parece ter se perdido ao adentrar as narinas,  chega a doer o peito como se tivesse sofrido um ligeiro impacto,
O coração bombeia oscilante, não mais cultiva o prazer que outrora foi impulso da imaginação.
Me dê um gole d’água ou talvez um soco nas costelas. Me devolva o direito de respirar.


Soluço

Desejos vis inconfessáveis.
Tão longe da razão e a um passo da loucura.
Pensamentos que não se calam, 
sentimentos que não se aquietam.
Cambaleio por entres os dias, esperando que a dor cesse, a matéria apodrece mais lentamente que a alma. 
Vago por entre a estupidez e a ignorância, tenho me tornado igual aqueles que eu detesto, Isso faz de mim pior que qualquer um deles.
Esperando que o tempo me impulsione,
Fecho os olhos, suspendo a respiração.
Nada adianta. O sentido literal não pode de ser alterado.